Ele esteve na festa de Santana em Caicó, esse ano de 2015, pregava a palavra do senhor e atacava os políticos
Foto: Icem Caraúbas
De acordo com, Genésio Pinto Neto, o Pôla Pinto, vice-prefeito de Messias Tarjem e presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Sintraf), amigo próximo do Padre do Junco disse que a sua morte deixará uma lacuna muito grande na luta pela igualdade social. “Ele sempre dedicou sua vida a justiça social, e defendia que as igrejas deveriam lutar pela igualdade de forma mais contundente. Na verdade ele dedicou sua vida na construção de mundo melhor. O pouco que tinha era para compartilhar com os mais necessitados. Diante dessa sua postura sofreu muita perseguição por parte da igreja católica”, disse Pôla Pinto.
Além disso, uma propriedade herdada pelo Padre do Junco na cidade de Messias Targino teve alguns terrenos doados por ele para que pessoas sem condições de adquiri um terreno pudessem construir suas casas. “Mesmo sem estudo formal, ele era uma pessoa muita inteligente que conseguiu aprender vários idiomas e se mantinha antenado com tudo que acontece no Brasil e no mundo”, disse.
Segundo ele, nos últimos dias o Padre do Junco que sempre combateu a forma como a igreja católica era conduzida, vinha se mostrando um admirador do Papa Francisco por sua postura mais popular. Além disso, ele começa a ver as redes sociais como forma de propagar suas ideias.
Seu maior sonho era construir em Messias Targino um abrigo para receber as pessoas que com o passar do tempo ficaram sem familiares e viviam sozinhas. “Um grande amigo que se vai. Um verdadeiro profeta do povo“, finaliza Pôla Pinto.
O sepultamento do Padre do Junco ocorreu na manhã desta segunda-feira, ás 9h da manhã no cemitério Público de Messias Targino, com grande participação popular, de amigos e políticos da cidade e região.
"Fariseus,
hereges, hipócritas, filhos de Sodoma e de Gomorra, arrependei-vos ou
serão castigados". Com um timbre de voz inconfundível e vestido em
indumentárias pouco convencionais para os padrões sociais tidos à conta
de aceitos, era assim, em muitas ocasiões, que Itamar de Almeida
iniciava as suas pregações e os seus protestos.
Filho de Manoel
Tomaz de Almeida e Raimunda Ricardina da Silva, Itamar de Almeida
começou a sua vida, ainda jovem, num seminário da Igreja Católica. Sendo
ele a própria encarnação da rebeldia e da fundamentada discordância,
não durou muito como interno e passou a pregar em todos os lugares.
Se ficou
conhecido popularmente como o "Padre do Junco", numa expressa referência
à sua missão de pregar a Palavra de Deus e também protestar contra
aquilo que achava estar errado, Itamar de Almeida também gostava de se
auto-intitular o "Leãozinho das Tribos de Judá", que biblicamente
remetia às Tribos de Judá e Israel, que continham nos primórdios da
humanidade o povo judeu, hebraico, israelita, protegido de Javé.
Rompido com a
Igreja Católica, Itamar porém nunca se afastou por completo da mais
antiga instituição religiosa do mundo. Nas Festas de Nossa Senhora das
Graças (Messias Targino) Santa Luzia (Mossoró), Santana (Caicó), Nossa
Senhora dos Impossíveis (Serra do Lima, em Patu) e Nossa Senhora das
Dores (Patu), além de outras da Igreja Católica, Itamar era presença
certa. Misturava-se aos fiéis nas procissões de cada festa e não tinha
qualquer receio de levar a sua mensagem, ora de explicação da Bíblia,
ora de protesto mesmo. Fazia o mesmo no Dia de Finados, quando passava o
dia inteiro pregando no Cemitério de São Sebastião, em Mossoró.
Profundo
conhecedor da Bíblia Sagrada, o "Leãozinho das Tribos de Judá" estudou
por conta própria, inclusive pelo rádio, e também se tornou profundo
conhecedor de artes e ciências diversas, adquirindo também razoável
conhecimento de outras línguas, como latim, inglês e francês.
Das qualidades
de um cristão, tinha duas certamente das mais nobres: o amor ao próximo e
o dom de partilhar o pouco que tinha. Recentemente Itamar passou a
distribuir lotes de terra que recebeu de herança pela morte de seus
genitores, repetindo um pouco o que lá atrás foi feito por seu avó (meu
bisavô) Manoel Fernandes Jales, o Sorinho, que atendeu a um pedido do
líder político Messias Targino da Cruz e juntamente com outros cidadãos
de espírito altaneiro doou grandes porções de terra para que pudesse ser
fundado o Povoado do Junco, que depois passou a ser Município de Junco e
Município de Messias Targino.
A propósito,
Itamar era essencialmente um seguidor de Francisco de Assis, mesmo que
não fosse formalmente integrante da Ordem dos Franciscanos.
Exageradamente simples, não juntava qualquer patrimônio e não se apegava
a nenhum bem material.
Aliás, foi
Francisco, o Papa, quem fez novamente Itamar voltar a admirar, mesmo que
à distância, a Igreja Católica, num ecumenismo que só ele explicava,
pois também exaltava pastores e religiões de cunho evangélico.
Objeto de matérias em jornais impressos e portais de notícias diversos, Itamar ganhou notoriedade em todo o Estado.
Morada certa?
Disse-me ele outro dia que só teve quando residiu com seus pais, no
Sítio Junco, nos arredores da cidade de Messias Targino. Costumeiramente
dividia seu tempo entre Messias Targino, Patu, Mossoró, Serra do Mel e
Natal. Dizia-se um andarilho a serviço da Palavra de Deus.
De tanto
protestar contra políticos corruptos, Itamar se lançou candidato várias
vezes a deputado estadual. Dificilmente obteria êxito num cenário de
estruturas políticas montadas há décadas, em que os pais passam o bastão
para os filhos, e assim por diante.
Nos últimos
anos estive muito próximo de Itamar. Em muitas manhãs eu ouvia a sua voz
inconfundível, perguntando no pé do portão: "O primo está?"
Mesmo sem idade
e sem autoridade para tanto, tomei a liberdade de o aconselhar em dias
em que ele parecia que sua mente viajava em velocidade de luz por temas
diversos. Eram dias em que ele parecia mais agitado, mais inquieto.
Algumas vezes consegui convencê-lo a voltar à calmaria.
Mas calmaria
era justamente tudo o que não combinava com o agitado "Padre do Junco",
pois ele entendia que a calmaria conduzia à resignação diante de uma
realidade social e política que ele tanto condenava, assim como também
condenava as formas mais banais de pecado tão visíveis em dias de hoje.
"Um homem à
frente do seu tempo", como bem definiu seu sobrinho e meu parente
Wescley Almeida, Itamar se rendeu em parte à tecnologia que domina o
mundo, ou ao menos a detalhes dela. Passou a mandar digitar suas
missivas e jogá-las em algum lugar das redes sociais e passou também a
usar o "pendrive" (nem sei se o nome é este) para armazenar hinos
religiosos e discursos seus.
Neste fim de
semana, porém, Itamar veio a óbito, vítima de parada cardíaca, já que
pouco cuidava do seu constante problema de elevada pressão arterial.
Morreu em Mossoró, um dos palcos principais de sua trajetória de
manifestações e pregações.
Nesta
segunda-feira, 10 de agosto, Itamar foi sepultado no Cemitério Público
de Messias Targino. Antes, recebeu na Igreja de Nossa Senhora das Graças
uma celebração digna de sua pessoa, além de muitas homenagens.
Nesta
segunda-feira, 10, Itamar, sem poder expressar a sua vontade, voltou ao
seio da Igreja Católica, onde começou a sua trajetória, e voltou também
ao chão da terra de seu pai, pois foi enterrado na parte nova do
Cemitério que foi foi fruto de desapropriação por parte da Prefeitura de
terras do meu tio-avô Manoel Tomaz de Almeida.
Primo, onde
estiver, descanse em paz. Deus, na sua infinita sabedoria, certamente
saberá enxergar em seus rompantes de euforia, motivados pelo desejo de
justiça social e de um mundo melhor, um conjunto de boas ações. Boas
ações, aliás, não lhe faltaram. De uma forma pouco convencional, você
verdadeiramente foi um cristão.
Fonte: Jornal de Fato
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